segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Pedro Angelo Almeida Abreu, Reitor da UFVJM

Graduado em Geologia pela Universidade de Fortaleza, tendo atuado representante estudantil junto ao órgão máximo da universidade em dois mandatos consecutivos; alcançou o mestrado em Geologia Regional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, doutorado em Ciências Naturais pela Universidade de Freiburg-Alemanha (1993) e pós-doutorado pela Universidade do Kansas (USA). Foi Diretor do Centro de Geologia Eschwege do Instituto de Geociências da UFMG, representando então o Centro na Congregação do Instituto de Geociências da UFMG. Diretor da Faculdade de Ciências Agrárias da FAFEID/UFVJM, de 2002 a 2006, tendo assento no Colegiado Superior da Instituição. Reitor da UFVJM desde 01 de agosto de 2007 .

Em seu segundo mandato o professor Pedro Angelo fala sobre o processo de expansão da UFVJM; faz um relato sobre o processo de criação e implantação do curso de Medicina e ressalta a importância da presença da universidade em Diamantina e no Vale do Jequitinhonha.

 

Passadiço Virtual: Como o senhor avalia o atual estágio de desenvolvimento da UFVJM? Quais os principais desafios e dificuldades da universidade nesse momento?

Professor Pedro Angelo: O nosso estágio de desenvolvimento é muito especial, pois combina a consolidação de vários cursos com a expansão da instituição. A UFVJM oferece atualmente 32 cursos de graduação e em curto prazo alcançaremos a marca de 44 cursos. Dos atuais 32 cursos, 10 não atingiram ainda a maturidade, ou seja, não formaram turmas, convivendo com cursos implantados em 2006 e em 2002, sem esquecermos-nos do curso de Odontologia, fundado em 1953, e o de Enfermagem, que teve o seu advento em 1997. A pós-graduação stricto sensu cresce de forma exponencial e atualmente a Instituição oferece 11 cursos de mestrado e 2 de doutorado. Também já contamos com 10 centros de pesquisa devidamente equipados e a extensão amplia cada vez mais a integração UFVJM/Comunidades dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri.

Por outro lado, estão em fase de implantação 2 novos campi nas cidades de Janaúba e Unaí, cada campus recebendo 5 cursos de graduação a partir do segundo semestre de 2013 ou do primeiro semestre de 2014. Ademais, atendendo ao projeto de governo de interiorização do ensino de medicina no Brasil, a UFVJM acolheu, na reunião de seu Conselho Universitário em 06/07/2012, a proposta de implantação de 2 cursos de medicina, sendo um em Diamantina e outro em Teófilo Otoni. Essa situação, por si, representa um desafio para a gestão, mas, sobretudo, para a Instituição que, sem abrir mão da qualidade, assume a responsabilidade de estabelecer ensino superior público de qualidade em territórios da metade norte do Estado de Minas Gerais. Certamente representa uma tarefa penosa, mas por ser virtuosa, as dificuldades e obstáculos serão desafios para superação pelo esforço e perseverança. A repercussão socioeconômica e política da interiorização do ensino superior público vale superar qualquer desafio e faz aflorar o espírito público de membros da academia e da sociedade na consecução de projeto tão virtuoso. O que se pronuncia para nossa Instituição, no meu entendimento, é uma dádiva, mesmo considerando o tamanho da tarefa, que carrega consigo uma missão para construirmos um futuro melhor para o povo brasileiro, em especial para as populações da parte setentrional de Minas Gerais.


Passadiço Virtual: Como está processo de expansão da UFVJM para as cidades de Janaúba e Unaí?  Qual ao significado dessa expansão para a universidade?

Professor Pedro Angelo: Estamos recebendo terrenos, por doação, para a implantação desses 2 campi. No caso de Unaí, inclui uma Fazenda de 75 hectares para as aulas e atividades de pesquisa no âmbito das ciências agrárias. O plano diretor físico dos campi está em fase final de elaboração, enquanto os projetos arquitetônicos de vários prédios dos novos campi estão em elaboração e serão licitados ainda em 2012 para início das obras no inicio de 2013, que somarão investimentos da ordem de 13 milhões de reais por campi no primeiro ano. Cabe salientar que a escolha dos cursos foi amplamente debatida em audiências públicas com as comunidades do norte e noroeste de Minas. O significado da expansão da universidade no contexto da nação foi mencionado na resposta anterior. Se focarmos sob o prisma da própria Instituição, ressalta-se, a priori, a agregação de competências e o ganho da diversidade trazida pelos novos cursos. A interação da competência e da diversidade resulta em uma maior capilaridade do conhecimento e a potencialização de produção acadêmica pela nucleação de saberes, que inclui a sabedoria dos povos de cada região onde se acha inserida a universidade. Pode-se destacar ainda como um valor potencial com a multiplicação de campus, a competitividade sadia entre grupos, cursos e campus da instituição.

 

Passadiço Virtual: O processo de implantação desses campi provocou uma grande mobilização da sociedade do Vale do Jequitinhonha na luta pela expansão da UFVJM para a nossa região. Afinal, quais as verdadeiras perspectivas de que isso ocorra nos próximos anos?

Professor Pedro Angelo: O movimento “a UFVJM é nossa” marca um novo tempo para o Vale do Jequitinhonha, “um novo tempo político”. Da passividade e autocomiseração histórica passou a defender o que é seu de direito, passou a reivindicar o investimento qualificado em seu território. É um começo, mas acena de fato para um novo tempo e espero que seja amadurecido e ampliado no escopo de potencializar a conscientização para escolha dos governantes e representantes parlamentares, estes para promoverem a intermediação no sentido da implantação de políticas públicas e não aquelas de caráter pessoal ou personalista, e aqueles para o exercício de gestão pública qualificada. O ensino superior público chegou ao Brasil, finalmente, depois de mais de 500 do seu descobrimento. Sim, porque o que aí estava servia fundamentalmente às elites, chegando de fato para quase todos com a expansão e interiorização promovida nos últimos 10 anos. O processo de expansão não terminou, existem ainda muitos vales do Jequitinhonha Brasil afora como territórios vazios na oferta de ensino superior público. A expansão do ensino superior público e gratuito deve ser do tamanho do Brasil, do tamanho da sua riqueza e do tamanho da sua vontade.

 

Passadiço Virtual: Muito tem se falado sobre o Curso de Medicina da UFVJM, gerando muita expectativa e especulações sobre a sua criação. Enfim, o que realmente temos de concreto sobre esse assunto? Quando começa o curso? Quantas vagas serão ofertadas? Onde o curso funcionará? Como será o processo de seleção dos alunos?

Professor Pedro Angelo: Como mencionado anteriormente, serão dois cursos: um no Campus de Diamantina e outro no Campus de Teófilo Otoni, cada curso ofertando 60 vagas por ano (30 por semestre). A seleção será feita conforme os demais cursos da UFVJM, ou seja, através do ENEM e do SASI (sistema de seleção seriada). Pelo SASI são ofertadas 50% das vagas, das quais 60% para estudantes oriundos de escolas públicas e como é aplicado exclusivamente em cidades dos vales do Jequitinhonha e Mucuri e do Norte e Noroeste de Minas (e algumas cidades do entrono), potencializa o ingresso de estudantes dos nossos territórios. A preparação do curso de medicina para o Campus de Diamantina vem sendo feita há 3 anos e, por isso, temos condições de iniciá-lo em 2013. O nosso campus de Teófilo Otoni não tem nenhuma estrutura de cursos da área médica ou de saúde e como a autorização para a implantação do curso nesse campus veio recentemente, temos um longo e ardoroso trabalho pela frente até conseguirmos estruturar a universidade e os hospitais da cidade para acolher o curso de medicina e, por isso, não se vislumbra qualquer possibilidade de iniciá-lo antes de 2014.

 

Passadiço Virtual: O ditado popular diz que filho feio não tem pai. Mas no caso do Curso de Medicina da UFVJM a situação é totalmente inversa porque tem muitos querendo ser pai da criança. Tem se tornado muito comum, principalmente em ano eleitoral, o surgimento de políticos que se autoproclamam como verdadeiros pais dessa criança. Enfim, como foi o processo de criação do Curso de Medicina da UFVJM? Quem são os verdadeiros responsáveis pela sua implantação?

Professor Pedro Angelo: Em última análise, a criação dos cursos de medicina da UFVJM partiu da iniciativa da Presidenta Dilma de interiorizar, no contexto de uma melhor distribuição geográfica no território brasileiro, o ensino superior de medicina no âmbito das universidades federais, pois esses cursos foram aprovados, de fato, através dos resultados dos levantamentos pertinentes para atender a interiorização referida. É verdade que alguns políticos trabalharam para a implantação de cursos de medicina na UFVJM e, nesse sentido, cabe reportar a iniciativa do Deputado Ademir Camilo que, nos idos de dezembro de 2007, solicitou autorização formal ao Conselho Universitário da UFVJM para fazer gestões junto ao MEC e ao próprio governo federal para viabilizar a implantação de curso de medicina no Campus do Mucuri da UFVJM. Seu trabalho persistente resultou no acolhimento pelo MEC da proposta, no entanto, por racionalização de infraestrutura e de competência instalada, em 2009 foi indicado pela Secretaria de Educação Superior do MEC que o curso seria implantado no Campus de Diamantina. Muitos deputados federais se envolveram na disputa pela implantação do curso em um ou no outro campus, alguns disputando a primazia da iniciativa ou o mérito (senão o privilégio) da conquista. No aspecto político, talvez pelas tantas mazelas que permeiam o nosso país e pela herança de uma esdrúxula colonização (assentada em uma organização cartorial, hereditária e do compadrio), continuamos a conviver com o imponderável ou, dependendo do prisma da análise, com o inacreditável. Ora, ora, toda ação política ou operação administrativa que parta de um político para o benefício de uma comunidade, de uma cidade, de um estado ou do próprio país deve ser visto, sempre, como a realização de uma obrigação. A investidura de um cargo púbico, seja de deputado, reitor, governador, prefeito ou ministro assenta-se no pressuposto do espírito público e da competência para o exercício do cargo ou função e não como um privilégio de sustentação hereditária ou do exercício da plutocracia. Se entendermos que a ascensão ao cargo é um privilégio, este deve ser conquistado pelo mérito da competência e o maior ou menor reconhecimento do trabalho executado no exercício da função pública deve ser manifestado pelo público que lhe dá sustentação, sem perdermos de vista, em nenhum momento, que a competência e a dedicação à causa pública é um pressuposto e uma obrigação.  A implantação desses cursos de medicina incorpora novos valores à região e à universidade e estabelece uma nova dimensão para a saúde coletiva das cidades dos territórios e, nessa perspectiva, tratemos, pois de festejar esse advento e tratemos, muito mais, de trabalhar para o estabelecimento de cursos de qualidade, com o apoio indispensável de casas de saúde devidamente adequadas e estruturadas para a formação qualificada de médicos com perfil voltado à saúde preventiva, à saúde coletiva, ao fortalecimento e qualificação do SUS, pois antes de médicos, devemos formar cidadãos cônscios dos seus deveres e dos compromissos com a população que viabilizou a sua formação acadêmica

 

Passadiço Virtual: Os impactos da criação e desenvolvimento da UFVJM na cidade de Diamantina são muito grandes, principalmente na economia da cidade. Há uma expectativa e um debate intenso sobre os aspectos positivos e negativos dessa mudança.  Como o senhor avalia essa relação entre a UFVJM e Diamantina? Como fazer essa relação se desenvolver de forma mais harmônica e benéfica para a comunidade acadêmica e para o cidadão diamantinense?

Professor Pedro Angelo: Os impactos socioeconômicos decorrentes da implantação de uma universidade ou de um campus universitário em uma cidade são visíveis e dimensionáveis, especialmente em cidades menores. A exemplo, a massa salarial da UFVJM é quase duas vezes superior à massa salarial da prefeitura do município de Diamantina, refletindo no fortalecimento do comércio e de todos os serviços correlatos. A demanda de serviços da população acadêmica é também expressiva, gerando emprego e renda. No entanto, o maior benefício trazido pela universidade para a sua cidade e região onde se acha inserida é muito mais nobre: a formação de massa crítica. A qualificação acadêmica sistematizada de pessoas que vão atuar na mudança da realidade da região, ocupando cargos técnicos, políticos e de gestão, imprimindo um senso crítico indispensável à organização social e à estruturação econômica dos territórios. Certamente que a postura pró ativa do poder público municipal no planejamento da cidade e do município como um todo será ou seria de fundamental importância para a acomodação do público que compõe a comunidade acadêmica, minimizando conflitos e tornando a cidade mais aprazível de forma a fixar esse pessoal que traz expectativas de acesso a serviços diferenciados e equipamentos de lazer utilizados de hábito nas suas cidades de origem. O plano diretor de qualquer município de pequeno ou médio porte que receba um campus de uma universidade federal deve levar em consideração esse ente como um organismo vivo da cidade, influente nas suas decisões, inquietante pela sua natureza e virtuoso pelo que produz e promove. O poder público municipal deve assumir também o papel de intermediador e de facilitador para estruturar a cidade de acordo com as demandas da instituição e de seus membros e, por outro lado, deve o pessoal da comunidade acadêmica comportar-se mais do que um citadino passivo, protagonizando, não apenas quando demandado, mas, sobretudo por iniciativa própria, a crítica e ações no sentido da construção de uma sociedade mais organizada, mais humana, em que valoriza os seus saberes sem preconceitos ou aversões ao inusitado e ao desenvolvimento científico e tecnológico.

Um comentário:

  1. Fenomenal a entrevista do Reitor. Gostaria de conhece-lo pessoalmente.

    Samuel Vianney da Cunha Pereira

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